Bonequinha de Luxo

Bonequinha de Luxo

domingo, 22 de abril de 2012

Análise do filme “Tudo sobre minha Mãe” e o mito da estrela – ídolos que nunca esquecemos

 

 

 

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Cecília Roth (Manuela)

 

 

O filme Tudo sobre minha mãe, do diretor Pedro Almodóvar narra a história de Manuela (Cecilia Roth), que leva o seu filho Esteban (Eloy Azorín) para assistir a uma encenação da peça: Um Bonde Chamado Desejo, de Tennessee Williams, para comemorar o seu aniversário, ao completar 17 anos.

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Manuela (Cecília Roth) e Steban (Eloy Azorín)

 

 

Ao fim do espetáculo, o rapaz corre para pedir o autógrafo à estrela da peça, Huma Rojo (Marisa Paredes) e acaba sendo atropelado e morto.

 

 

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Huma Rojo (Marisa Paredes) na peça um Bonde Chamado Desejo

 

 

Meses depois, Manuela vai a Barcelona à fim de rever o pai do seu filho morto e o encontra transformado no travesti Lola (Toni Cantó).

Lá, ela conhece Agrado (Antonia San Juan), outro travesti e também conhece Rosa (Penélope Cruz), uma freira engravidada por Lola, de quem contraiu o vírus do HIV, quando ele era seu namorado.

 

 

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Agrado, Manuela e Irmã Rosa

 

 

Manuela não encontra Lola para contar sobre Steban e aproveita a ocasião para dar o apoio à Irmã Rosa, que está muito doente e prestes a dar à luz ao filho de seu ex-marido.

 

 

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Irmã Rosa (Penélope Cruz)

 

 

Ao mesmo tempo, Manuela começa a trabalhar como secretária da atriz Huma, sem lhe contar, porém, sobre a parcela de culpa da morte de Esteban.

 

 

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Huma e Manuela

 

 

O filme Tudo sobre Minha Mãe do diretor espanhol revela mulheres solidárias e que vivem suas agruras no cotidiano, sem ódio e acima de tudo muito femininas, construídas pelo olhar irreverente deste diretor. A obra traz diversas homenagens e referências de filmes como A Malvada (1950) e Uma Rua Chamada Pecado (título brasileiro do filme de 1951), baseado na peça Um Bonde Chamado Desejo. Pelo trabalho, Almodóvar ganhou o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 2000 e dedicou o prêmio “a todas as atrizes que viveram atrizes. A todas as mulheres que representam. Aos homens que representam e se tornaram mulheres. A todas as pessoas que querem ser mãe. À minha mãe.” (Bravo, 2008, p. 93)

 

 

 

O MITO DA ESTRELA DE CINEMA: ATOR VERSUS PERSONAGEM

 

 

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Bette Davis no filme A Malvada (1950)

 

 

Assim como o personagem Steban faleceu em busca de um autógrafo da atriz Huma Rojo, como seu fã, muitos de nós também temos nossos ídolos.

Segundo o escritor Bernard Shaw: “O selvagem adora ídolos de madeira e de pedra; o homem civilizado ídolos de carne e de sangue”. (Morin, 1980, p. 01)

A película de Almodóvar homenageia o filme A Malvada (EUA/1950) com Bette Davis. Este filme mostra uma visão irônica dos bastidores do cinema. O diretor também homenageia o filme Uma Rua Chamada Pecado, ganhador de 04 Oscars.

O ator americano Marlon Brando, no auge da beleza e sensualidade foi um dos chamarizes da produção do diretor turco naturalizado americano Elia Kazan.

 

 

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Vivian Leight e Marlon Brando (cena do filme Uma Rua Chamada Pecado - 1951)

 

 

O papel de Stanley Kowalski, protagonista do filme exigia do ator desafios imensos e o astro provou à altura deles e de muitos outros que fizeram depois. O ator brilha em produções menores como O Último Tango em Paris (1972), de Bernardo Bertolucci. O filme ficou datado, mas a interpretação de Marlon Brando continua brilhante. (Bravo, 2008, p. 148)

 

 

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Marlon Brando no set, do segundo filme de sua carreira

 

 

Segundo Edgar Morin, o cinema é um comunicador de mitos, sejam coletivos ou individuais. Por definição, os mitos estão para a coletividade, como os sonhos para o indivíduo.

 

 

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Bette Davis

 

 

Dançarinas, crooners e atrizes de teatro e cinema de grande beleza marcaram o cenário das artes desde o início do século XX e algumas são famosas até nossos dias, outras ficaram na memória do público. A estrela determina as múltiplas personagens dos filmes e encarna nelas e transcende-as. Mas, estas transcendem-na por sua vez, as suas qualidades excepcionais e refletem-se nas estrelas. O representador e o representado determinam-se mutuamente. Os atores de composição não são estrelas, prestam-se às personagens mais heterogêneas, mas sem lhes impor uma personalidade unificadora. Nem todos os heróis são necessariamente encarnados por estrelas. As estrelas situam-se por vezes a nível mítico tão elevado que absorvem sem reciprocidade os seus intérpretes, há uma absorção do ator pela personagem. Terminado o filme, o ator volta a ser ator, a personagem permanece personagem e do seu casamento surgiu um ser misto que participa de um e de outro. (Morin, 1980, p. 34)

 

 

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Bette Davis

 

 

Aqui, um mito é um conjunto de condutas e de situações imaginárias que Morin descreve para as suas estrelas. Quando se fala do mito da estrela trata-se, portanto, em primeiro lugar, do processo de divinização a que o ator de cinema é submetido e que faz dele ídolo das multidões. (Morin, 1980, p. 35)

A elegância da estrela excede a verossimilhança. O estético domina o real. É certo que a estrela pode estar modestamente vestida num impermeável (signo cinematográfico da solidão e da penúria feminina), ou mesmo em andrajos. Mas o impermeável e os andrajos são criações de grandes costureiros. (Morin, 1980, p. 39)

 

 

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Audrey Hepbun (cena do filme Bonequinha de Luxo-1961) e seu lenço de seda Hermes e vestindo o impermeável

 

 

Em tempos de cultura pop, astros de cinema deixaram de serem apenas ícones de suas épocas reproduzidas exaustivamente em diferentes mídias (...), suas imagens viraram emblemas de comportamento extremamente atuais. Holly Golightly, vivida por Audrey Hepburn em Bonequinha de Luxo (1961), tornou-se mais do que uma alpinista social da novela de Truman Capote, em que o filme de baseia. Sua preocupação em estar sempre bem-vestida antecipou a atitude dos que vivem no mundo fashion, de quem hoje ela é uma espécie de padroeira. (Bravo, 2008, p. 13)

Atualmente, no universo da moda, seguimos pelos caminhos do efêmero e da felicidade de estar bem-vestidos, mesmo com a nossa imagem de pessoa comum, anônimos a vida inteira. Segundo Flügel: “O sentimento de estar perfeitamente bem-vestido proporciona às vezes uma paz que a própria religião não consegue dar.” (Navarri, 2010, p. 20)

 

 

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A roupa expressa personalidade e estado de espírito

 

 

As histórias produzidas pelo cinema são continuamente recicladas na televisão e no vídeo; por isso, a cultura popular, através da citação e repetição de padrões narrativos, pode retirar delas um livro de recordações reconhecível na iconografia e nos gêneros. (Mulvey, 1996, p. 15)

Os astros do cinema vivem em castelos com piscina, tem coleções de roupas de grife, vivem acima dos mortais. Os seus amores são confusos e casam-se inúmeras vezes. Mas, o importante é que as estrelas de cinema sempre nos convidam a abrir bem os olhos, no escurinho do cinema e nos fazem voltar para o mundo da imaginação, da ilusão e da fantasia.

Neste filme, Almodóvar realizou uma bela homenagem à sua mãe, à atriz Bette Davis e ao cinema de Hollywood.

Além disso, o diretor também provoca o espectador com outros temas relacionados à sexualidade e gênero, como construções culturais, portanto, passíveis de alteração e desarticula os conceitos de normalidade.

O uso destes temas culturais funcionam como estratégias criativas para acessar o ponto crítico do espectador. Ao reconhecermos e aceitarmos nosso cotidiano fica mais fácil para modificá-lo, caso não seja do agrado de cada um.

 

 

 

Ficha técnica do filme

Título: Tudo sobre minha mãe

Roteiro/Direção: Pedro Almodóvar

Ano: 1999

País: Espanha

Elenco: Cecília Roth, Marisa Paredes, Candela Piña,Antonia Sanjuan, Penélope Cruz, Toni Cantó e Eloy Azorín.

Gênero: drama

Referência bibliográfica:

1) DROGUETT, Juan. O feitiço do cinema: ensaios de Griffe sobre a sétima arte. São Paulo: Saraiva, 2009.

2) May, Lary. Screening Out the Past. Oxford University Press, 1980.

3) MORIN, Edgar. As estrelas de cinema. Coleção Horizonte de Cinema. Ed. Livros Horizonte Ltda: Lisboa/Portugal, 1980.

4) NAVARRI, Pascale. Moda & Inconsciente: olhar de um psicanalista. São Paulo: SENAC, 2010.

5) Revista BRAVO! ESPECIAL. 100 filmes essenciais. 2ª edição. São Paulo: Editora Abril, 2008.

6) Revista Mente&Cérebro – no. 201

Imagens extraídas do livro:

LANDIS, Deborah Nadoolman. Dressed a century of Hollywood costume designer. New York: HarperCollins Publishers, 2007.